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(Provérbio antigo)



quinta-feira, 29 de setembro de 2011

"PROFESSORES E ESCOLAS COM PROBLEMAS" x SUPERAÇÃO

LUZ NO QUADRO NEGRO
Texto: Ana Luísa Vieira


Ao ser alfabetizada, Cybele ouviu barbaridades das professoras. Virou educadora para que outras crianças não passassem pelo mesmo. E transformaou o ensino de uma das regiões mais pobres da Bahia

 A FALA MANSA DE CYBELE AMADO, de 44 anos, comprova que não é preciso gritar para promover uma revolução. A ineficiência da agressividade. Aliás, é algo que ela conhece desde os primeiros anos de escola, em Salvador. “Quando aprendi a letra S, havia uma cobra desenhada na cartilha. Perguntei à professora se cobra não era com C, e ela berrou: ‘Você só precisa copiar! Assim nunca vai aprender a escrever!’”.
Diagnosticada com dislexia leve, distúrbio que fazia confundir algumas letras, Cybele se acostumou a receber no caderno mensagens do tipo “TUDO ERRADO!”. Mas, com a ajuda de uma psicóloga e da mãe, o possível trauma revelou-se vocação.
Já na 8ª série, Cybele descobriu que seria professora, e que usaria métodos bem diferentes daqueles que experimentou no primário. Numa viagem à Chapada Diamantina, conheceu um povoado com péssimas condições de ensino. Decidiu que aquele era seu lugar. Trocou o conforto da capital por uma casa sem energia elétrica. E com ternura, conhecimento e empenho transformou o ensino público da região. O Instituto Chapada de Educação e Pesquisa (Icep), por ela fundado, atende a 22 cidades da área central da Bahia, onde, em 2005, apenas 11% das crianças de até 8 anos sabiam ler e escrever. Hoje, o índice é de 80%.
Como as professoras viam sua dislexia?

Cybele – Elas não entendiam minha dificuldade. Para elas, era incompreensível que criança não aprendesse pelo método de juntar o B + A = BA, repetindo e repetindo. Até o dia em que minha mãe procurou uma psicóloga para me ajudar.
Qual tipo de apoio você recebeu?

Cybele – Toda noite, antes do jantar, minha mãe, que não terminou o Ensino Médio, reunia os seis filhos e lia Monteiro Lobato, Jorge Amado... Meu pai, caminhoneiro, ajudava na matemática. Repeti de ano uma vez e me lembro de uma sessão com a psicóloga. Ela me mostrou uma borracha, maleável, e uma prancheta, rígida. Perguntou como eu queria ser. Optei pela borracha.
Quando teve certeza de sua vocação?

Cybele – Na 8ª série, fui chamada para dar aula de reforço de matemática. Era divertido: usava os problemas do cotidiano para mostrar as operações, reunia a turma no pátio para estudar. Meus pais sempre falaram: “Quem não vive para servir não serve para viver”.
Esse lema te impulsionou?

Cybele – Tenho uma certeza visceral de que, em grupo, podemos mais. Acredito no método construtivista, que vê a criança como sujeito e estimula seus pensamentos. Aprendi que o ensino só acontece quando olhamos nos olhos dos dos alunos. O poder não pode estar centralizado no professor. Cheguei a montar uma escola baseada nesses princípios antes de ir para a Chapada Diamantina.
Como você descobriu a região?

Cybele – Passei um Carnaval lá. Voltei chorando, sem entender o abandono das escolas, e prestei concurso público para dar aula ali. Quando passei, fiquei radiante. Aos 23 anos, mudei para uma casinha onde nem sequer tinha energia elétrica, no distrito de Caeté-Açú, de menos de mil habitantes, na cidade de Palmeiras, a 480 quilômetros de Salvador.
E como começou a atuar?

Cybele – Dava aulas no Ensino Fundamental. Todos os alunos eram mais velhos que a faixa etária natural. Levei meus livros e discos. Fiz um concurso de poesia. Aos poucos, fui ganhando a confiança deles.
E a relação com os professores?

Cybele – Nós nos reunimos para discutir os problemas e pensar em planos de aula. Em 1996, nos inscrevemos no programa Crer para Ver, da Natura. Conseguimos apoio para que 70 professores fizessem cursos nos fins de semana, por dois anos. Estudávamos as boas práticas na sala de aula. Não se pode pensar que os alunos são caixas vazias nas quais podemos colocar o que bem entendemos. Eles precisam interpretar o que recebem. A evasão caiu, e a vizinhança quis replicar a ideia. Nosso trabalho se espalhou por 12 municípios.
Que novas práticas foram adotadas?

Cybele – Em uma aula de história, por exemplo, trouxemos um senhor de 88 anos que contou sobre os anos difíceis da Chapada. Durante a narrativa, fomos relacionando o relato a grandes fatos históricos. Também nos preocupamos em incentivar a leitura. Os professores passaram a oferecer livros aos meninos maiores para que escolhecem, lessem e os recomendassem aos colegas. Os menores interpretam o texto sentados em roda. Instigamos as crianças a perguntar e a ter vontade de obter respostas.
Assim nasceu o instituto?

Cybele – Foram os primeiros passos. Em 2000, enviamos novamente uma proposta para o Crer para Ver e realizamos novos cursos. Em 2006, fundamos o Instituto Chapada para coordenar o projeto.
Quais os números atuais?

Cybele – Já atingimos mais de 4 mil professores e 85 mil alunos de 22 municípios. Temos os três melhores Idebs (Índice de Desenvolvimento de Educação Básica) de toda a Bahia.
Qual a maior recompensa do projeto?

Cybele – Ver os meninos crescer. A Fernanda, por exemplo, filha de agricultores, acabou de entrar na Universidade Federal da Bahia. Acertou 80% da prova de língua portuguesa no vestibular, vai cursar letras. É gratificante demais. Para mim, a fé é a crença de que, juntos, podemos mudar tudo o que queremos.

 Para saber mais sobre o Icep, acesse: http://www.institutochapada.org.br

 Fonte: Revista Sorria* - Para Ser Feliz Agora – ed. 19 – ano 4 – abril/maio 2011– Editora MOL


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